A terra do craque-exemplo recebe a Rainha de braços abertos.Esta noite, pela primeira vez na carreira, Marta desfilará seu talento no mesmo palco onde Rivaldo deu os primeiros passos como profissional. O que o Arruda reserva a Marta? O pernambucano era fonte de inspiração desde quando a menina franzina corria despretensiosamente pelos campinhos de pelada na cidade de Dois Riachos, interior de Alagoas.
A revelação foi feita na entrevista exclusiva concedida ao Superesportes, ontem à tarde. Nenhum outro jogador chamava tanto a atenção da garota, que na ausência das amigas dividia o espaço com garotos. Marta aprendeu a driblar desde cedo. Muito antes das europeias e norte-americanas, um tal de preconceito ficou na saudade.
Talvez por isso hoje ela faça tanta questão de expor a vaidade. O maior talento do futebol feminino brotou do lugar onde a modalidade era tratada como coisa exclusiva de homem. Hoje, aos 25 anos, a mulher que adora cremes e é apaixonada por óculos escuros é também a maior referência no que faz. A ponto de deslocar uma equipe de televisão da Alemanha para Brasil para acompanhar seus passos.Nesta quarta-feira, a equipe do Superesportes foi obrigada a respeitar a ordem de chegada. Antes de atender à reportagem, a Rainha dedicou minutos preciosos aos alemães. Quem diria, quem poderia imaginar que a menina chegasse tão longe? Certamente nem mesmo os familiares presentes ao lado da craque no saguão do hotel.
Pela primeira vez você atuará na cidade conhecida por ser um amuleto da Seleção masculina. Quais suas impressões do Recife até o momento?
Desde a saída do aeroporto a gente pode sentir o calor da torcida, assim como no trajeto até o hotel. Agora espero ver isso no jogo. Apesar de o adversário não ser mais a Argentina, tenho certeza que as meninas da seleção pernambucana vão dar o máximo. Queremos proporcionar um belo espetáculo ao povo do Recife. Tomara que possamos trilhar o mesmo caminho da seleção masculina em 1994, que veio a Pernambuco e, em seguida, foi campeã mundial.
No futebol masculino, o peso da Copa do Mundo é incomparável. No feminino, qual conquista é mais importante: a Copa do Mundo ou a medalha de ouro olímpica?
As duas competições são extremamente importantes no feminino, porém a Copa do Mundo é um momento só nosso. É o momento do futebol feminino. Sem dúvida isso é algo muito especial. E a gente chegou tão perto em 2007… Temos consciência de que precisamos ganhar um título dessa dimensão para que possa acontecer algo no Brasil em relação à modalidade. É sempre gostoso participar de uma Olimpíada, onde encontramos atletas de diversos países e modalidades, mas a Copa do Mundo tem um gostinho especial por ser a nossa competição.
Quanto sua experiência pode ser importante para o grupo nesta Copa do Mundo?
Ter sido eleita a melhor do mundo cinco vezes logicamente é algo muito positivo. Sem dúvida tenho experiência para passar a algumas das meninas que estão aí, novatas no grupo. Enfim, sei que posso ajudar tanto dentro como fora de campo.
Chegou a hora do Brasil livrar-se do estigma de vice? O que falta para chegar ao inédito título?
O futebol feminino não tem tanto tempo de vida quanto o masculino no Brasil, então a estrutura não é a mesma. Na seleção, não. Aqui sentimos falta de nada. Temos exatamente o mesmo que o masculino. Mas a ainda nos falta muito de estrutura nos clubes. A ausência de projetos e investimento nos deixa num patamar diferente em relação aos homens. Mesmo assim já chegamos perto mais de uma vez.
Apesar de ainda ser jovem, aos 25 anos você já foi eleita a melhor do mundo cinco vezes. Acredita que já chegou ao ápice da carreira ou ainda pode render ainda mais?
Ainda me falta ganhar um título importante com a seleção. Isso com certeza é o que sinto falta.
Diante de todas as dificuldades, qual foi a maior para se tornar atleta profissional?
Meu começo lá em Dois Riachos foi uma história bem parecida com a da maioria das meninas que estão na Seleção hoje. Vim de uma cidade pequena, onde as pessoas não enxergavam o futebol como uma modalidade para meninas. Desde muito nova tive que passar por esse tipo de barreira. Enfrentar o preconceito, pois não havia nenhuma menina que tivesse interesse por futebol. Então tive que me sujeitar a jogar com os meninos, e isso era o mais difícil. Minha família e mesmo a população não encarava como algo normal. Corriam muitos comentários e meus parentes ficavam constrangidos, mas também nunca chegaram a fazer nada de anormal para me impedir de jogar. Eles não me deixavam sair de casa pra jogar algumas vezes, mas eu sempre dava um jeito.
Como você enxerga as comparações com Pelé e onde surgiu o apelido “Pelé de saia”?
Isso surgiu quando eu jogava na Suécia. Pelé sempre foi muito idolatrado lá. Certa vez joguei a final da Copa da Uefa no mesmo estádio em que ele ganhou a Copa de 58. Foi aí que começaram a me chamar de Pelé de saia. Isso saiu de lá e veio para o Brasil. E pegou, né? Para mim é muito gratificante ouvir esse tipo de comentário, ser comparada a Pelé. Mesmo que nem ele nem eu jogasse de saia, tá valendo (risos).
Você teve algum ídolo em quem se inspirou, ou em alguma jogadora, como Sissi ou a norte-americana Mia Hamm?
Confesso que não tive muita oportunidade de acompanhar essas jogadoras, talvez por falta de informações. Mas logicamente sei da importância delas na história. O cara em que me espelhei foi Rivaldo. Adorava vê-lo jogar. Dos atuais, gosto de ver Neymar, Ganso, Ronaldinho Gaúcho…
Numa rápida autocrítica, você se considera a melhor jogadora da história?
Não gosto de falar de mim. Deixo que as pessoas falem. Você nunca vai ouvir da minha boca que sou a melhor.
Perfil
Nome: Marta Vieira da Silva
Idade: 25 anos
Naturalidade: Dois Riachos/AL
Altura: 1,62 m
Títulos:
Brasileiro Sub-19 (2001) – Vasco da Gama
Liga dos Campeões (2003/04) – Umea/SUE
Campeonato Sueco (2005, 2006, 2007 e 2008) – Umea/SUE
Copa da Suécia (2007) – Umea/SUE
Libertadores da América (2009) – Santos
Copa do Brasil (2009) – Santos
Liga de futebol dos Estados Unidos (2010) – Gold Pride
Jogos Pan-americanos (2003 e 2007) – Seleção
Sul-americano (2003 e 2010)
Prêmios individuais
Melhor jogadora do mundo pela Fifa (2006, 2007, 2008, 2009 e 2010)
Bola de Ouro da Copa do Mundo Sub-20 (2004)
Bola de Ouro da Copa do Mundo (2007)
Chuteira de Ouro da Copa do Mundo (2007)
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